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sexta-feira, 30 de julho de 2010

Valores de um Livro


Acredito que essa reflexão possa vir a servir como um apêndice aos apontamentos fornecidos pelos artigos “Opinião e Senso Crítico” & “A qualidade da Arte: Entre o Erudito e o Popular”. Pois o valor da arte esteve presente em toda a discussão anterior. Que valor teria o livro? Que significado ele representa para um leitor? Seria um apreciado da mesma forma por pessoas diferentes?
Antes de pensarmos propriamente no valor literário de um livro, pensemos nele como uma mercadoria, e os valores que isso trás. Karl Marx, grande pensador alemão, atribuía à mercadoria dois principais valores: o valor de uso e o valor de troca.
 O valor de troca é aquele mais ligado ao comércio. Quantos romances valem um trabalho acadêmico? Quantos livros infantis eu preciso para conseguir um best-seller? O valor de troca está constantemente sobre a influência do mercado, tendo os fatores de oferta e procura agindo sobre seu preço. Quando vemos, por exemplo, um best-seller custando menos na livraria que um livro de pouca circulação, não podemos pensar que seu preço inferior se deve única e exclusivamente por sua baixa qualidade. Isso porque, se tratando de uma produção voltada para a venda e com um número de cópias elevado, ele possui um preço de tiragem menor do que aquele que foi lançado em pequenas tiragens.
No caso de um trabalho literário, seu valor de uso pode ser múltiplo. Ele pode servir para instrução, como um trabalho acadêmico, manual ou livro didático. Pode vir a gerar prazer, como um bom romance. Pode garantir status, como uma biblioteca pessoal cheia de livros que às vezes nunca são lidos, mas estão ali para quem ver pensar que está lidando com um intelectual. Ou então, em último caso, ele pode vir a servir de bom nivelamento para a mesinha da sala. O valor de uso é aquele ligado ao emprego que se dá aquele objeto como mercadoria. Só pela pluralidade desses valores, já podemos ter uma noção aonde esse ensaio vai nos levar, não é mesmo?
Porém, antes de problematizar isso, acho interessante sair um pouco da visão marxista e lançar mão de outros dois valores que uma mercadoria pode ter. Pensemos em seu valor de identidade. Identidade sim, pois nenhuma ação humana é dada em solitário. Todas elas implicam no reconhecimento de um grupo. Andar de skate te lança em um grupo, o dos skatistas. Ouvir determinada música, gostar de determinado tipo de roupa, e curtir determinado tipo de leitura. Eu, por exemplo, me encaixo no grande grupo dos leitores de fantasia. É meu campo, é na área em que eu me identifico e cada livro que eu leio, que eu discuto, trazem consigo esse valor identitária, daquilo que me constitui como pessoa, como leitor, e como escritor. Um bom lugar para vermos esse valor de identidade do livro é no site de relacionamentos Skoob e ver algumas fotos de perfis aonde as pessoas fazem questão de posar segurando, lendo ou simplesmente próximas a determinados livros. Ali, o valor identitário é claro, pois a mensagem clara que se passa é que essa pessoa se reconhece em um grupo. Um grupo que curte determinado autor ou determinado trabalho.
O último valor que me interessa chamar a atenção — e esse talvez seja o mais importante para fins deste ensaio — é o afetivo. Esse talvez, seja o mais complexo de todos, pois se refere a individualidade. Que valor determinado livro teria para uma pessoa se este fosse aquele primeiro que ela leu na vida? Ou então, se for o livro que sua mãe lia para você quando era criança? Ou quando aquele livro significou para você uma mudança de vida, uma nova forma de ver o mundo ou de pensar o que você faz? Pensemos nesses valores que independem totalmente da qualidade da obra, ou do que ela significa para um grupo. Esse é um valor que independe das leis do mercado, ou dos usos que você pode dar a ele.
Vou dar um exemplo prático e pessoal. Pensemos no que “O Véu” significa para mim. Ele foi o primeiro livro que escrevi, meu primeiro trabalho completo e que me fez acreditar que eu realmente posso escrever. Alguém poderia dizer o que ele significa para mim? Eu posso alegar com toda a certeza do mundo que ninguém que o ler, por mais que goste ou não, vá chegar perto de sentir por esse livro o que ele significa para mim. Pois esse é um valor totalmente pessoal que reflete várias coisas minhas e que não dizem respeito a mais ninguém. Esse é o valor afetivo de um livro, e que dá a ele seu caráter complexo.
Valores. Essa palavra deve sempre ser pensada no plural. E quando pensada no singular, tem que ser especificada: que valor? Para quem? Não podemos dizer um único valor, como se o preço cobrado em uma livraria ou seu índice de vendar pudesse definir o que ele significa. No máximo conseguiremos uma definição dele — é um livro pouco requisitado, ou é um best-seller — mas dificilmente poderemos chegar a uma essência dele. A algum valor que possa ser único é aplicado a todos os seres humanos. E com isso, quero dizer poder alegar com toda a certeza do mundo que um livro é bom ou ruim. Como se esses fossem dados universais e que poderiam ser divididos por todos.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Gosto e Senso Crítico


O presente artigo visa completar a discussão proposta no “A qualidade da Arte: entre o erudito e o popular” postado na semana anterior. No primeiro ensaio, eu discuti a atual concepção de que quando um trabalho possui pouca venda, ou pouca circulação, é um sinal de que ele é mais erudito e, por isso, melhor. E agora, pretendo fazer o inverso e problematizar um pouco a idéia que associa capacidade venda de um livro ao índice de qualidade.
Best-sellers existem aos montes. Eles estão por aí, nas vitrines de livrarias, ganhando versões no cinema e sendo matérias de capas de jornais e revistas. Eles fazem sucesso, são bastante aceitos pelo público e isso rende a seus autores rios e mais rios de dinheiro. Porém, seria essa aceitação apenas mérito da qualidade do trabalho?
Vou lançar um exemplo que me parece viável. Quantos de nós compramos um livro apenas por um chute? Quantos de nós chegamos a uma livraria e fechamos os olhos e apontamos para uma direção qualquer e o livro indicado será levado, comprado e lido? Eu não conheço ninguém que faça isso e eu mesmo não o faço. O que fazemos quando vamos a uma livraria comprar um livro aleatoriamente: primeiro, vamos à sessão que nos atrai — fantasia, terror, suspense, história, biografias, etc. Se não nos deparamos com o trabalho novo de um autor que já gostamos e temos de procurar um livro completamente novo, olhamos a capa daqueles disponíveis, certo? Vemos se ela nos atrai. Depois, lemos a sinopse, analisamos o que o trabalho está propondo para nós e se aquilo é do nosso gosto. Se for, aí sim damos o nosso (Pré) conceito e o levamos, ou não. Não é assim que funciona? E nesse processo, é a qualidade da obra que definiu a escolha? Não, mas sim um gosto pessoal, algo que o abriu para aquele livro.
Enganam-se quem pensa que o leitor é uma tábua rasa. Que ele está ali de forma passiva para receber tudo o que o autor propõe. É ele quem procura a história. É ele que, baseado num gosto pessoal, procura o que comprar. Ao ler um livro, ele já imagina o que possa estar ali e vai interpretar a história de acordo com a sua perspectiva. Nesse sentido, não é propriamente a qualidade da obra que vai lhe atrair, mas a capacidade da mesma em atrair seu interesse.
Mas qual seria a diferença então entre dizer, “gostei do livro” e “o livro é bom”? Parece simples, não é mesmo. “Mas é claro que se eu gostei do livro, é por que ele é bom”. Não necessariamente. Ou será que realmente temos um gosto tão bom que tudo o que gostamos é de melhor qualidade? Isso me parece, no mínimo, pretensionismo. Eu mesmo confesso, que nem tudo o que é bom me agrada e nem tudo o que é ruim me causa repulsa. Sinceramente eu detesto a prosa realista. Não gosto mesmo da proposta de se avaliar o ser humano única e exclusivamente por uma perspectiva biológica/científica. Mas entre isso e dizer que autores como Machado de Assis, Aluizio de Azevedo ou Eça de Queiroz são ruins, seria ignorar toda a contribuição que esses homens deram ao que seria a intelectualidade de língua portuguesa. Em contrapartida, eu simplesmente adoro sátiras de filmes de terror no estilo do filme “Todo Mundo em Pânico”. Sério, gosto mesmo. Mas daí a dizer que esse tipo de filme, com suas piadas de baixo escalão, sua nudez sem motivo e sua falta de roteiro, é bom. Bem... Acho que não. E não vejo o menor problema em assumir que eu gosto de coisa ruim. Afinal, não precisamos única e exclusivamente gostar do que é bom, como se o nosso gosto pudesse ser uniformizado e possamos todos pensar de forma igual. A coisa não funciona assim.
Mas então, e o senso Crítico? O que seria ele, o que o definiria? Bem, aí vocês teriam que recordar o artigo antes publicado: “O peso da Crítica no Brasil”. Aonde eu defino o que, a meu ver, é uma boa crítica. Uma boa crítica exige, acima de tudo, a capacidade de argumentação e justificação. Você diz que um trabalho é bom por isso e maio isso. E esses argumentos têm que ser válidos, pesáveis, discutíveis. Gostar de um filme por que determinado ator é bonito ou porque determinada atriz aparece pelada, são argumentos validos sim. Claro, não estou negando isso. Mas eles dizem respeito a um gosto específico. Eu acho um livro bom quando: ele é bem escrito, ele discute bem o tema proposto, seus personagens são convincentes, consegue trabalhar um tema complexo, possui uma linguagem fluida sem perder a qualidade, tem um roteiro bem estabelecido e não divaga inutilmente. Esses e outros são argumentos que, a meu ver, fazem parte de um bom senso crítico.  
Mas então, qual o objetivo desses dois ensaios que vos escrevi? Simplesmente mostrar o que é óbvio: que o índice de vendas e a aceitação de uma obra não definem sua qualidade. Seja para melhor, seja para pior. Não podemos acreditar que a capacidade de gerar lucro defina que um livro é bom, assim como não podemos pensar que tudo o que cai no gosto popular é apenas lixo. Existem inúmeros fatores que estão por trás do que é popular ou o que é restrito a uma minoria. Fatores esses que vão muito além da qualidade de uma obra.
Sempre é bom lembrarmos que todo o texto tem seu contexto. Ou seja, todos eles atendem a perspectivas do seu tempo e espaço e são aceitos de acordo com sua capacidade de atender a exigência deles. Para encerrar com um bom exemplo, gostaria de falar da série de livros “Os Diários do Vampiro” de L. J. Smith. Se esses livros foram produzidos na década de 90 do séc. XX, então porque será que só agora fizeram tanto sucesso?
Teria o trabalho ganhado qualidade nesses anos? Ou ao contrário, a autora teria se vendido ao mercado e abaixado a qualidade do seu trabalho para que ele caísse no gosto popular? Nenhuma das duas, a séria continua a mesma. Acertou aquele que disse que uma certa mulher de meia idade, ruiva, que comanda uma ordem de vampiros que brilham no sol, tem alguma a coisa a ver com isso.
É claro, Foi a série “Crepúsculo” de Stephanie Meyer que possibilitou isso. O “Boom” que seu trabalho gerou, criou um ambiente fértil, repleto de pessoas ansiosas por mais e mais literatura vampiresca. Uma fama que contribuiu par a aceitação de trabalhos sobre vampiros publicados antes e depois de “Crepúsculo”. E mesmo Stephanie Meyer também é fruto herdeiro de uma fama maior da literatura fantástica, que ganhou muita força com J. K. Rowling.  Enfim, a coisa é complexa. São elementos múltiplos que geram a aceitação de um livro, elementos esses que vão além da capacidade de um bom autor de escrever ou não uma boa história. O bom pode ou não ser vendável assim como o ruim pode ou não ser ignorado. Enfim, esse foi o objetivo de todo esse ensaio. ^^

domingo, 18 de julho de 2010

A qualidade da arte – entre o erudito e o popular.


Seria a qualidade de alguma manifestação artística possível de ser medida única e exclusivamente pelo seu índice de aceitação? Seriam os mais vendidos os melhores? Ou seria o contrário, e o menor número de vendas significaria que uma obra está sendo apreciada por um grupo mais seleto, erudito? Essa é uma questão complexa, por isso dividirei esse ensaio em dois, pois quero abordá-lo em duas linhas de frente. Nesse primeiro, pretendo problematizar a concepção de que para uma obra de arte ser considerada boa, ela tem que estar restrita a um público tido erudito. E no segundo, irei abordar as diferenças entre gosto e senso crítico para melhor entender o espaço que há entre qualidade e poder de lucro.
Como é a proposta dessa primeira parte, começarei lançando mão dessa nova onda “Cult” que parece ganhar força, principalmente nos cinemas. Filmes como ‘Laranja Mecânica’, ‘Juno’, ‘Once’, ‘Simplesmente Feliz’ e outros e mais outros que são produzidos e conseguem um bom público sem a participação comercial de Hollywood. Filmes cults são entendidos comumente como aqueles trabalhos voltados para um público mais restrito. Talvez intelectuais, ou pessoas que se dizem com um gosto mais refinado do que outros. Não estou negando que filmes como ‘Once’, ‘Juno’ ou ‘Menina má.com’ sejam realmente bons. E isso se deve sim em grande parte por eles, na medida em que não possuem vínculos com grandes patrocínios, estarem livres para trabalharem seus roteiros de forma a não precisarem prestar contas de vendas com seus investidores. Porém, entre o filme ter liberdade de tratar assuntos pouco vendáveis e a concepção contemporânea de que todo o filme Cult é bom, ao passo que todas as produções hollywoodianas são ruins, existe um imenso abismo.
Essa concepção reduz tudo o que vende ao patamar de baixa qualidade. Como se o popular só gostasse do que é ruim e isso vem, em grande medida, de uma herança histórica. Histórica sim, pois desde muito tempo a produção tida intelectual era, e ainda é, fruto de circulação de uma pequena parcela de pessoas, geralmente mais abastadas. E estas tendiam/tendem naturalmente a ver seu gosto como o mais apurado enquanto as manifestações populares eram/são tidas como inferiores ou de mal gosto. Então, proponho de devamos nos indagar um pouco sobre essa questão.
Um exemplo interessante para se trabalhar é o de observarmos a trajetória de alguns artistas. Quando eles não fazem sucesso, têm um público restrito, é muito comum a crítica os valorizarem dizendo que eles possuem uma boa qualidade musical. Até mesmo seu público parece mais fiel na medida em que se sente como eleito. Porém, quando eles ganham os holofotes, temos uma verdadeira avalanche de críticas negativas e, simultaneamente ao fato de seu público crescer, temos o fenômeno dos antigos fãs reclamando, dizendo que o artista se vendeu para as grandes produções ou que sua qualidade caiu à medida que ele se tornou um ‘burguês’. É claro que, às vezes, esse modelo funciona, mas nem sempre deve ser aplicado. Isso que vou dizer pode parecer óbvio, mas em alguns casos não seria possível que um determinado livro, CD ou DVD deixe de vender simplesmente pelo fato de ele ser ruim? Não haveria casos em que um determinado autor, cineasta ou músico faça sucesso por que ele é bom?
Como eu gosto de pensar sempre: tudo o que é simples demais induz ao erro. E nesse caso a coisa não é diferente. O que eu percebo – e não sei se concordaram comigo – é que em alguns casos a impressão que dá é que quando algum público se liga muito a um artista pouco notável, o que gera é um sentimento de identidade para com ele. Não uma identidade voltada propriamente para o trabalho, mas sim de pertencer a um grupo seleto, de ser diferente na multidão. E aí, quando seu grupo seleto cai no gosto do público, você, que tinha sua identidade própria, se vê imerso em um mar de pessoas iguais a você. Você, de especial, passa a ser mais um na multidão.
Isso pode ser bem notado no exemplo da moda. Pois às vezes, quando alguém tem um estilo próprio e de repente vê que ele caiu no gosto popular, rapidamente vê a necessidade de se modificar, de mudar de estilo, pois não aceita o fato de ele estar sendo reproduzido por todos. Já perceberam esse fenômeno com alguém? Eu já. Muitas vezes.
Concluindo um pouco essa confusão, não quero propor nada por enquanto, visto que ainda tenho outro artigo para completar minha linha de raciocínio. Só então, depois de os dois pontos extremos serem abordados, que vou dizer exatamente para que escrevi tudo isso. ^^ Espero que venham a gostar...

domingo, 11 de julho de 2010

O peso de fazer crítica no Brasil

Fazer crítica é uma arte, um trabalho que exige do profissional não só conhecimento sobre aquilo de que está falando, como o bom senso de saber o seu papel e, principalmente, seus limites. Eu percebo aqui no Brasil, e não sei se essa opinião é compartilhada, certos equívocos com relação à crítica. Equívocos esses que acabam por permitir excessos. E fazendo uma análise dos tipos de trabalhos críticos, acho que posso dividi-los em dois pólos bem delimitados: A crítica ‘laudatória’ e a crítica ‘cética’.
Quando digo crítica laudatória, falo daquela que aparentemente não consegue ver erros nos trabalhos analisados. É aquela crítica digna de Fausto Silva que diz que todos os convidados que vão ao seu programa são (se não o melhor) um dos melhores na sua área de atuação. Nada contra elogiar um trabalho bem feito, pois isso é o mínimo que se pode fazer para com um grande artista, porém, não devemos pensar que um ato crítico é apenas o de elogiar alguém.
A cultura brasileira parece ainda presa a uma idéia de cordialidade, como apontou Sérgio Buarque de Holanda em seu livro ‘Raízes do Brasil’. O brasileiro, segundo ele, seria um homem cordial por natureza, sempre educado, hospitaleiro e que, por conta disso, não parece muito disposto a chamar a atenção do outro por algum erro ou equivoco, para não parecer mal educado ou grosseiro. Sou obrigado a concordar com esse historiador, pois isso aparece bastante na crítica laudatória, uma crítica que parece ter timidez em apontar os defeitos de um trabalho.
Já a crítica cética é o extremo oposto. Ela é aquela que pode encontrar a sua figura caricata em personalidades como Ronaldo Esper. Que são homens que não parecem ver qualidades em nada, humilhando aqueles quem analisam de forma a muitas vezes perder a noção do seu papel ao falar sobre moda ou música. Noto muitas vezes em homens como esses, certo recalque. Ouvindo-os falar, percebo em seus discursos o que poderia ser chamado de um discurso do fracasso. Digno daquele profissional que nunca conseguiu reconhecimento pelo que fez e acaba por descontar naquele que quer crescer.
Um bom lugar para ver isso são algumas críticas de teatro, aonde se fecharmos os olhos, conseguiremos ver nitidamente um jovem que fez aulas de teatro com um Tony Ramos ou uma Fernanda Montenegro e viu seu sonho morrer enquanto os amigos deslanchavam na carreira. E francamente, falar mal por falar, expor um profissional ao ridículo, por pior que ele seja, não é fazer crítica e sim dar “pitaco”. E um “pitaco” muito recalcado e muito invejoso.
Então, se crítica não é elogiar e não é criticar, o que é crítica? Crítica é acima de tudo uma análise, um diagnóstico de alguma obra intelectual e artística. O ato de crítica necessita do bom senso de quem julga, de avaliar e de fundamentar suas opiniões. Gostar porque gostou e odiar porque odiou, não é crítica, é dar uma opinião, pura e simplesmente. Uma crítica tem que ser justificável, pois quando não, cria sérios problemas para o trabalho daquele que é avaliado.
Para aquele que é elogiado em demasia, acarreta pouca compreensão sobre os limites de seu trabalho. Nenhuma produção é perfeita e alertar quanto a isso não é ser grosseiro, mas sim permitir que aquela pessoa cresça e futuramente venha a corrigir os problemas. Aquele que escuta demasiadamente a mãe dizer que seu trabalho é perfeito e não tem acesso a outros pontos de vista, pode acabar estando despreparado para momentos posteriores que em que vai encontrar pessoas mais imparciais. Ou então pode correr o risco de expor seu trabalho a um público maior que vai massacrá-lo. Mimar um artista é o mesmo que mimar uma criança, pois desprepara para o mundo
Em contrapartida, o oposto também não ajuda. Pois se não existe nenhuma obra perfeita, também não existe nenhuma obra imperfeita por completo. Todo trabalho tem pontos positivos e exaltá-los é importante, pois a crítica tem como finalidade proporcionar o crescimento, coisa que não é possível se o juiz está preocupado em se fazer de engraçado para um público ou só descontar suas frustrações em quem não pode se defender. Analisar é fazer um juízo e não ser um algoz.
Finalizando minhas considerações, o que eu acho da crítica. Elogiar e apontar defeitos são elementos de qualquer crítica. Uma não existe sem a outra e mesmo que seu olhar não esteja apurado o suficiente para conseguir detectar todos os pontos de um trabalho – coisa que acontece, já que nem sempre conseguimos ver os lados bons ou ruins de alguma coisa -, você como crítico, tem como função primordial fundamentar suas acusações. É bom? Por quê? Quais os pontos positivos? É ruim? Por quê? Quais os defeitos que você identificou e o que poderia ser feito para solucioná-los? Acho que essas são as perguntas básicas que qualquer um que se lance para analisar um trabalho tem que se fazer antes de expor uma opinião que visa ser crítica. Agora, para as observações do dia a dia, para os “pitacos” entre amigos, não temos esses problemas, pois também não vamos nos policiar para cada palavra que venhamos a soltar. Porém, quando você expõe uma opinião que pode ser vista por todos, que tem potencial para mudar certas concepções sobre uma obra, então você sim, tem o dever de ter o senso ético de saber dosar as palavras e reconhecer os limites do que está fazendo.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Tipos Ideais


Acredito poder dizer que esse artigo serve como um apêndice para o “Por Personagens mais humanos”. Isso porque o tema “modelos” ainda está presente nele, só que de forma diferente. A idéia para tanto me veio após algumas conversas sobre “tipos ideais” que eu tive com alguns amigos. Um tema esse que achei interessante trazer para cá.
Tipos ideais estão sempre presentes na literatura, seja como forma crítica a algum grupo ou personalidade, seja na forma de criar um modelo de pessoa, de homem, de cidadão ideal para a sociedade. Na maioria das vezes, eles não conseguem fugir ao estereótipo, e embora atualmente a arte esteja se desenvolvendo a ponto de conseguir driblar esse risco, não acredito que essa característica seja de fato uma desvantagem. Pelo menos em alguns casos. Isso porque esses estereótipos podem, muitas vezes, servir a uma causa. Eles podem estar ali não apenas um erro de concepção do autor, mas também um meio de formular uma boa crítica.
Nesse caso, me refiro especificamente à comédia e, em especial, à sátira. Pois este é de fato um estilo muito utilizado a fim de criticar, as vezes um grande grupo ou uma moda estranha. Normalmente, os personagens que são criados com esse fim, apresentam uma série de estereótipos, clichês, e por isso nos causam certo estranhamento, pois não condizem totalmente com a realidade. Para ilustrar bem minha idéia, vou usar um personagem que, acredito eu, seja de domínio público. Refiro-me a Homer Simpson. ^^
Afinal, quem não gosta — ou pelo menos conhece — daquele amarelo gordo e sem muita educação? Eu particularmente adoro. Mas o mais legal de se usar Homer Simpson para essa discussão é mostrar como muitas vezes o uso excessivo de estereótipos serve a um ideal. Homer Simpson é o personagem criado com o intuito de servir como tipo ideal para se entender o “American Stupid White Man”, ou seja, entender como funciona a mente americana e, por que não dizer, do homem ocidental, em maior ou menor grau. Mas é por conta desse objetivo que Homer acaba trazendo para si muitas características desse tipo: Gordo, classe média, careca, mal educado, ignorante, preconceituoso, homo fóbico, bobo, preguiçoso, e etc., etc., etc. Ufa, cansei.
 Provavelmente jamais encontraremos um Homer Simpson na rua e nesse sentido podemos dizer que ele é um personagem surreal, com o qual não podemos nos identificar. Mas isso seria um resumo muito simplista do caso, pois a idéia de Homer Simpson não é representar uma pessoa específica, mas um grupo em geral, logo, as características presentes em todo o coletivo são trazidas para uma pessoa só. Desse modo, podemos dizer que cada um de nós (nós mesmos, afinal, brasileiros não estão isentos desse modelo) trás um pouquinho de Homer Simpson dentro de si. E esse é o objetivo de Homer.
Para isso servem os tipos ideais, para a construção do que seria todo um coletivo. Por conta disso eles são surreais, pois eles são muitos em um só. E para uma crítica, quanto mais abrangente for, melhor.
Mas agora, um pequeno parêntese antes que eu termine minha exposição dando a impressão que para o caso da crítica a verossimilhança não seja importante. Pois ela é. Pois mesmo personagens como Homer, não são também apenas negativos. Não podem, pois nenhuma crítica é baseada apenas em apontar defeitos, mas também qualidade. Nesse sentido, Homer também trás características positivas. E vou apontar algumas.
Ele é fiel em seu casamento acima de tudo. Já teve inúmeras oportunidades de triar Marge , mas nunca o fez.
Ele sabe reconhecer quando está errado e muitas vezes, sabe pedir desculpas quando nem ao menos sabe o que fez de errado. Nisso, chamo a atenção para o episódio Lisa Vegetariana, em que ele diz para a filha: “Lisa, me desculpe. Eu não sei o que fiz de errado, mas sei que é sempre culpa minha”.
Nesse sentido, tipos ideais também têm que apresentar os dois lados da moeda e não apenas o ruim ou o bom. Eles têm que ter equilíbrio, pois essa é a característica que nos define.