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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Resenha: O livro do fim do mundo, diversos autores


Pegando carona na onda apocalíptica gerada pela profecia Maia, a editora Subtítulo lançou mão desta publicação que reúne mais de trinta contos de autores dos quatro cantos do Brasil. Organizado por Alessandro Finardi, Eder Rosa e Márcio Saconato, “O livro do fim do mundo” se propõe a explorar as sensações humanas levadas ao limite ao ter como norte das propostas dos contistas a seguinte indagação: “o que você faria se o mundo fosse acabar em uma hora?”.

A qualidade dos trabalhos é variada, atraindo e repudiando diferentes gostos e estilos de leitores. No geral, as histórias exploram o medo, a violência e as redenções esperadas com a iminência do fim. E como não tenho condições de falar de cada um dos trabalhos que estão aqui presentes, escolho os meus três favoritos para dedicar linhas especiais.

O primeiro, “...and I feel fine” de Leandro Samora, mereceu um artigo próprio, publicado anteriormente aqui no Por detrás do Véu. Tal empatia que me gerou o trabalho se baseia no fato de este, com um tom irônico e divertido, tocar fundo em questões interessantes a respeito da vida e do tão sonhado “fazer valer a pena”. Um conto que de forma ácida, nos faz repensar máximas já batidas, presentes nos mais pueris livros de autoajuda.

“Carta à senhorita Wargrave” foi uma iniciativa ousada de Cássio Maia. Ousada, pois distorceu aquilo que se comumente esperava da proposta inicial da antologia. Nele, não temos um apocalipse geral, mas um fim do mundo muito particular. Algo que tinha tudo para dar errado, mas que graças à originalidade e ao talento estético do autor acabou por se converter em uma obra prima e que merece o devido destaque.

E por último, mas não menos importante, “Das consequências para quem noticia o fim do mundo”, de Raul Gimenez. Este conto se destaca por trazer uma crítica sutil e inteligente dos valores que permeiam nossa sociedade. Do desapego e ceticismo que podem acometer nossos corações modernos mesmo na iminência do fim.

O gênero conto é o ideal para pessoas que, como a maioria de nosso presente volátil, percebem que o relógio corre cada vez mais rápido; que cada vez dispomos de menos tempo para fazer as coisas simples da vida. Nesse sentido, “O livro do fim do mundo”, além de se encaixar perfeitamente nessa realidade, fornecendo leituras agradáveis para pessoas que só possuem tempo para ler nos intervalos da vida, também oferece um esforço crítico acerca das condições que criaram essa sociedade que taxa preços cada vez mais altos para seu tempo e ainda assim continua sem saber lhe dar o devido valor.
 

 

 

 

 

Resenha: Jarbas, de André Bozzetto Jr.


Em uma era onde as figuras de nossos pesadelos do passado se transformam em personagens andróginas de romances adolescentes, encontrar um livro como “Jarbas” nos enche de espanto e agradável nostalgia. Recheado de muita tensão, violência e crueldade, o trabalho de André Bozzetto Jr. garante ao leitor bons momentos de frisson e adrenalina, permeados de aventuras noturnas em um mundo perigoso e decadente, no melhor estilo punk & gótico.

Jarbas é um jovem de classe média, cuja natureza bestial precede em muito sua transformação em lobisomem. Entregue a sua natureza animalesca como talvez nenhum outro licantropo se tenha permitido, este jovem vaga pelas noites deixando para trás trilhas de sangue, violação e profundo terror. Seu nome, conhecido e temido por humanos e outros seres sobrenaturais, passa a ser palavra chave nas principais caçadas noturnas.

Os personagens de “Jarbas” são, em geral, frios. Pessoas sofridas que se tornam endurecidas pelas experiências traumáticas de suas vidas. Existem aqueles ainda que tentam conservar a inocência, todavia estes são os primeiros a serem engolidos pela natureza selvagem própria deste romance de Bozzetto.

Do ponto de vista estilístico, este é um trabalho bastante interessante, onde a história do jovem lobisomem é conta através de inúmeros recursos. Em alguns momentos, temos a narrativa imparcial em terceira pessoa, em outros o relato vivo de suas vítimas. É provável que alguns leitores percebam pouca diferença entre os tons dos relatos, deixando a escrita muito uniforme. Contudo, escrever diferentes relatos, onde cada um deles expressa a experiência de uma personagens específica, carregada de suas singularidades psicológicas e seus vícios de linguagens não é um tarefa fácil. E André, sem dúvidas, não faz feio em sua empreitada.

Em suma, o que tenho a dizer de “Jarbas” é que este é um livro altamente recomendado. Ele não está comprometido em fornecer grandes momentos de reflexão, mas se propõe a garantir fortes emoções e aventuras dignas dos estômagos mais fortes. E para leitores com saudade dos antigos monstros, este é um prato cheio.