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segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

O Eu e o Outro – Uma análise de Avatar.



Superprodução estreada nos cinemas brasileiros dia 18 de dezembro de 2009, Avatar é sem dúvida muito mais que uma história de fantasia, é ação, romance, magia, aventura, entre outras coisas, que promete agradar a todos os tipos, adultos e crianças, homens e mulheres, cristãos ou umbandistas, gregos ou troianos. Isso por que ele tem uma história leve e que prende a atenção do espectador. Basicamente a única desvantagem do filme é sua duração quase três horas, que obriga aqueles com menos capacidade de reter urina a irem ao banheiro, perdendo preciosos minutos.
Porém, de todas as coisas fantásticas que eu vi na tela do cinema, a coisa da qual mais me encantou foi o fato que o filme me fez pensar muito. Engraçado dizer isso, pois muitas pessoas pensam que os trabalhos de fantasia servem apenas para se desligar da realidade, fugindo dos problemas e questões do mundo empírico. Bem, quem viu Avatar, percebeu que a coisa não é assim. Pois, muito além de mostrar uma guerra entre raças pelo domínio de um planeta, o filme nos faz pensar, pelo menos no meu caso, na complicada relação entre o Eu o Outro, tão presente no mundo desde os tempos antigos e que perdura até os dias de hoje. Os conflitos entre gregos e bárbaros no mundo antigo, as lutas entre pagãos e cristãos na Idade média e a guerra entre israelitas e palestinos no oriente médio, são retratos desse mesmo tipo de questão: a difícil tarefa de se tentar entender o outro.
Esse tipo reflexão me foi imposta ao ver duas cenas em específico do filme, que eu vou falar, mas não sem antes dar um breve resumo do filme para aqueles que não viram. Avatar é um filme que se passa num planeta distante, chamado Pandora. Nesse mundo, chegam os humanos, vindos de uma Terra doente e interessados nas riquezas do lugar. Porém, Pandora não é desabitada, e nela vivem um grupo alienígena com características humanóides conhecidas como Navis, e eles se mostram um empecilho aos planos dos colonizadores em explorar a região, gerando conflitos por conta disso.

Uma das cenas que mais me chamou a atenção foi uma em que uma região sagrada para os Navi, que simboliza o elo entre eles e seus antepassados e sua Deusa Eywa é destruído por tratores humanos. Esse episódio me chamou muito a atenção, pois me fez lembrar um livro que li há pouco tempo, intitulado o “Paraíso Destruído”, de “Bartolomé de Las Casas” em que ele narra a destruição da América pelas mãos dos colonizadores europeus. Nesse relato, ele, que testemunhou todo o massacre, descreve as mais cruéis formas de extermínio as quais os nativos foram submetidos pela ação do homem branco. Mas além de me lembrar de toda essa dor, essa relação dos Navi com sua área sagrada me fez recordar um outro tipo de estudo. No primeiro semestre de 2009, eu fiz um curso sobre a temática do Holocausto – massacre nazista aos judeus, homossexuais, ciganos entre outros durante o governo de Hitler. – na minha faculdade com a doutora Mônica Grin. Dentre os temas que foram discutidos nesse curso, uma aula em específico falou de algumas formas de crueldade que se praticavam contra os judeus nos campos de concentração. E uma dessas práticas que ela destacou foi a de cortar as barbas de alguns prisioneiros judeus ortodoxos. Eu me lembro bem que naquela época não havia entendido muito bem, mas hoje, vendo o filme e me baseando na fala de um dos personagens - Parker Selfridge, interpretado por Giovanni Ribisi – que diz, “nós não podemos jogar poeira nem mesmo em uma folha, pois esses selvagens vêem tudo como sagrado”, eu compreendi. De fato, o que a destruição daquela árvore sagrada significou para os Navi? O mesmo que a barba para o judeu, a igreja para o católico ou a pureza de não se comer carne de vaca para o hindu. Todos eles significam ligações muito íntimas com uma divindade importante e que ao se romper, faz o ser humano perder o contato com aquilo que é essencial para sua vida. De fato, quando pensamos a coisa por esse lado, podemos entender como algo sem valor para nós, pode significar um tesouro para outros.

Outro momento muito bom do filme e uma passagem em que o próprio Parker fala: “Nós oferecemos de tudo para eles (Os Navi): estradas, educação, tudo, e eles não querem nada” Acho muito interessante essa fala, pois nos mostra um juízo de valores sem igual por parte do humano ao tentar ver o Navi. Na visão do colonizador, aquele ser selvagem que habita as matas de Pandora não tem educação. Mas afinal, de que tipo de educação estamos falando? Então, tudo o que o personagem Jake Sully, não foi nada? Talvez não, para um olhar etnocêntrico que só vê como educação aquilo que é aprendido numa escola. Indo além, eu me questiono: do que servem estradas para um povo altamente acostumado a caminhas pelas matas? Concordo que estradas sejam importantes para nós, que vivemos no mundo urbano, mas será que elas são essenciais para outros povos. Não estou aqui falando exclusivamente dos Navi, mas sim de inúmeros outros que preferem viver nas selvas do nosso mundo. Seriam eles pobres ignorantes que não sabem dar valor ao que é “bom”?

Esse momento do filme me fez refletir mais uma vez e me fez questionar essa coisa do progresso. Pois essa desculpa de se levar o progresso para uma região atrasada, já foi muito utilizada para justificar barbaridades e em Avatar, a coisa não é diferente.

Bem, resumindo minha colocação, eu acredito que muito além de um filme de entretenimento muito bem produzido, Avatar ganha mais pontos por ser uma história inteligente que, muito além de entreter, ajuda agente a pensar. Se prestarmos bem a atenção, podemos ver que Pandora é na verdade uma das muitas faces da Terra e que os Navi, são na verdade um dos muitos de nossos vizinhos que não compreendemos.

A quem não viu, eu recomendo que veja, pois vale à pena. Só uma dica: Não beba nada antes de ir ou durante a sessão, pois um minuto vale ouro.



2 comentários:

  1. assisti este filme e achei maravilhoso parabens

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  2. Acho realmente que o Filme deu muito o que pensar!!!
    Um filme muito inteligente, com um roteiro maravilhoso!
    O que eu acho engraçado, é que assistindo o filme, as pessoas enchergam os atos humanos para com os Navis uma barbaridade, mas quando acontece debaixo dos nossos narizes, por vezes dentro dos nossos lares, não enchergamos desta maneira!
    Por que existe realmente uma relutância na natureza humana, em aceitar o que é diferente?

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