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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

A crítica entre o pessoal e o profissional: uma linha tênue


Retomando o tema proposto no artigo “O peso da Crítica no Brasil”, decidi discutir um pequeno detalhe que acredito ter ficado solto. Falo aqui da confusão que há normalmente entre o trabalho de um profissional e o próprio profissional na hora de se fazer e/ou receber uma crítica.
Quando se faz uma resenha crítica de um livro, por exemplo, ou de qualquer outra manifestação artística profissional, o que eu percebo em determinados casos é justamente que não se tem muita idéia de quem é o verdadeiro alvo da crítica: se o autor, como ser humano e produtor do trabalho, ou o trabalho em si, como construção, algo que resume um instante daquele que o produziu, e que por isso, não deve ser usado para taxá-lo pela vida inteira.
Vou tentar ser mais específico. Primeiramente, partindo do ponto de vista do autor que recebe uma crítica. Este, como profissional, tem que entender que, se seu trabalho é criticado, desqualificado, ou desmerecido, isso se reflete a seu trabalho e não a si mesmo. É perigoso tentar atribuir as “ofensas” para si próprio, como se o crítico estivesse lhe agredindo, lhe desrespeitando. Isso porque, como autor, ele tem que estar aberto a elas, tem que saber dialogar com elas e, se necessário, defender suas idéias se achar que a opinião do crítico não é coerente. Ele não deve apropriar a crítica para si e atacar o crítico com num desejo de se vingar por alguma injustiça cometida.
Tal tendência, pode gerar um certo problema para o debate em torno da literatura, pois o alvo de uma crítica ruim, ao ter a sensação de injustiça e o desejo de retaliação, vai acabar atacando seu crítico, muitas vezes, apenas para causar-lhe o mesmo mal que ele lhe causou. Aí, de críticas pessoais a críticas pessoais, um debate que deveria discutir idéias, elaborar diálogos de modo que todos enriquecessem com o que era discutido, acaba tornando-se uma baixaria aonde o único objetivo é o de ofender o outro. Logo, saímos de um debate intelectual e chegamos ao nível de uma briga de rua, aonde o único motor motivador das pessoas para o assistirem é ver o circo pegar fogo. O que é lamentável.
Agora, partindo para o crítico, esse também tem que saber reconhecer seu limite, pois um trabalho, por pior que seja, deve ser analisado com base única e exclusivamente no trabalho. É claro que o autor pode ser citado em momentos como: “O autor explorou pouco esse aspecto” ou, “O autor desvirtuou tal idéia”. Ou, “Faltou pesquisa do autor ao tratar disso”. Mas o nome do autor tem sempre que vir vinculado a obra, pois se não, você como crítico profissional, está saindo de seu terreno e está simplesmente ofendendo aquele que você devia ajudar a crescer, com frases como: “O autor é um idiota” ou “O autor é um lixo”. Seria mesmo? Não poderia, sei lá, ser apenas uma má fase? Ou então, ele ser um iniciante e com potencial para crescer?
Vou dar um exemplo específico da área de História. Atualmente, quando nos debruçamos sobre a História Medieval, temos um autor top a ser estudado: O Frances Jacques Le Goff, grande medievalista do séc. XX. Um verdadeiro mestre no assunto. O “Supra Sumo” dos medievalistas. Porém, até mesmo esse grande historiador cometeu suas gafes. Em alguns momentos, durante as aulas, nos debruçamos em escritos mais antigos deste historiador e vemos uma série de mensagens preconceituosas ou antiquadas sobre a Idade Média. Coisas que você como aluno conhecedor se pergunta: “Nossa, mas Jacques Le Goff escreveu mesmo Isso?” É realmente difícil de acreditar, mas aconteceu. Isso porque, como todo o autor, Jacques é humano, e como humano, cometeu erros que foram corrigidos.
Agora, se nos prendêssemos a esses erros e resolvêssemos julgá-lo apenas por esses escritos pelo resto de sua vida, com certeza o mundo perderia um grande historiador, pois trabalhos excelentes que vieram depois seriam simplesmente desprezados. Isso porque, ele como humano, também se desenvolveu, aperfeiçoou sua escrita e aprendeu com seus erros. Assim como todo o autor.
Por isso que sou contra quando uma crítica resolve atacar o autor diretamente, pois assim, além de castrar o potencial desse escritor de crescer com seus erros, também está criando um preconceito bobo que corre o risco de ser disseminado para outros possíveis futuros leitores.
Nesse sentido, o que eu prego é uma postura profissional dos críticos, que eles saibam se posicionar e saibam reconhecer os limites de seu trabalho. Hoje, com a internet, temos inúmeros meios de fazer uma crítica. Basicamente, qualquer um com um teclado (como eu. ^^), ou uma webcam, ou um microfone, pode expor suas idéias para o mundo. Mas esse enorme poder vem também com uma grande responsabilidade – para citar Stan Lee, em “Homem Aranha” rsrs. E por isso devemos saber os limites de nossa ação.
Temos muitos críticos ruins Brasil e no mundo. E eles estão em toda a parte: nos jornais, nas revistas, na televisão e também na grande rede. Por isso, não seja mais um deles. Ser educado não é ser conivente, ou então ser um covarde que não sabe se impor. Significa apenas que você já possui um nível de senso crítico tão grande, que não precisa se valer de ofensas e gritarias para conseguir expor suas opiniões. E você, autor que recebeu uma crítica, também não seja infantil ao ponto de achar que as pessoas estão sendo más com você; ou prepotente ao ponto de pensar que eles não entendem de nada e que seu trabalho é bom e ponto final. Humildade é sempre importante. E ouvir as críticas é bom para saber os limites e potenciais de sua produção, que - acredite meu amigo - não são ilimitadas.

5 comentários:

  1. Eita, foi profundo heim amigo!!! Amei esse post!
    Eu, como uma boa leitora, costumo criticar em minhas resenhas, e classificar o que é bom, como bom e ruim o que realmente é ruim. Tento sempre sim, ver a obra e não o autor. Como no caso das minhas resenhas da série de Stephenie Meyer, Crepúsculo. Ali coloquei minha opinião a respeito da série, e tive também o cuidado de avaliar as outras obras da escritora e ver que, tudo aquilo, foi só o início. Um começo que não agradou a mim em certos aspectos, mas que gerou à ela uma legião de fans.
    Com a leitura das críticas em geral, eu aprendi algo muito importante: Tem muuuuuuiiittoooosss bons autores desconhecidos, com obras publicadas, que vale a pena ler, viajar e se encantar com eles.
    Por isso, Willian, eu te digo, de todo meu coração: minha crítica ao "Véu" foi a mais sincera possível! ^^
    Por fim, admiro seus pensamentos e ainda vou te ver por aí assinando muitos livros!
    Uma boa quinta-feira pra vc e não se esqueça de dar um pulinho lá no meu blog tbm... Beijocas!

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  2. Assunto digno! Crítica literária é um assunto que me atrai extraordinariamente. Concordo com tudo o que você disse, pois não há dúvidas de que a falta de bom senso com as críticas só poderá desentendimentos. Porém penso que isso é apenas o básico, pois ainda há muito envolvido nisso. Com isso quero dizer que a próprio estética tem definições incertas, além de que com o tempo os conceitos da "boa Arte" mudam: o que para os parnasianos era o supra-sumo da arte poética, para os modernistas era uma vã superficialidade com ritmo e rima.

    Embora estes problemas de precurso, preciso concordar com uma opinião que já te vi declarar: para qualquer escritor, especialmente os iniciantes, a crítica é um importante feedback.

    Adorei a postagem. Um grande abraço, xará!
    William.

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  3. hehe É, foi um pouco profundo sim Nessie. pois me encomoda muito esse pouco praparo crítico daqueles que fazem disso um ofício. Principalmente porque a crítica é muito importante para escritores iniciantes, mas o que a maioria faz é só querer destruir aqueles que não podem se defender, seja por serem inciantes demais, seja por estarem por demais em evidencia e qualquer contra ataque seria um sinal de fraqueza.
    E nisso eu concordo com você xará. ^^ O conceito de bom, assim como todo o conceito vivo está sempre em tranbsformações e por isso existem alguns autores que são considerados "a frente do seu tempo", pois possui uma estética que só vai ser apreciada depois. E aqueles que creem que sua época será eterer, têm que acordar, pois ela não será. AS coisas, os gostos, as tendências e até as próprias palavras mudam com o passar dos anos. Se tem uma coisa que eu aprendi ao estudar História é isso. :)
    E é por uma boa crítica que o Cyro Lobo, a Rubia Barcellos, a Flávia Massêo e a Heloísa Pacheco, e eu, estamos montando o Apenas escritos, para tentar, na medida do possível, dar boas cr´tiicas aos futuros escritores e ajudá-los a encontrar o caminho certo rumo a editoras. Com certeza eels teram mais sorte do que eu, que tive de me matar para ter um reconhecimento. ^^
    Abraços gente.
    P.S. não é desabafo não. rsrsr

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  4. Muito bom teu texto... E realmente vc tem razão, tem que existir uma linha diplomática entre a recepção do autor a crítica do crítico.

    Não só na literatura, mas na música. Só lembrando que o primeiro disco do led Zeppelin foi considerado uma porcaria pela critica da época. E deixaram passar despercebidos uma estética musical que certamente ia ditar toda uma forma de se fazer musica na década de 70'. E mesmo assim Led certamente tem trabalhos muito ruins...

    Todos tem altos e baixos e penso que dá para vc construir uma crítica em cima de um trabalho de forma a acrescentar para o leitor (e atlvez até para o artista) aspectos da obra que se deixaram perder. Como muito bem vc colocou no seu excelente artigo!

    Efim, grande abraço! parabéns!

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  5. hehe Valeu mesmo Facundo. Realmente, podemos encontrar exemplos críticos em várias manifestações artísticas, como na música, no cinema, no teatro, ou na literatura, como eu quis mostrar.
    Abração cara

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