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domingo, 29 de julho de 2012

Fan fic


Acredito que não exista gênero literário mais popular, contudo menos reconhecido do que a Fan Fic. Neste estilo, um autor, fá de outro autor, se propõe a escrever acerca de uma história já existente de seu ídolo, aproveitando assim seus personagens, cenário ou até mesmo tramas que, na imaginação do adaptador, ficaram incompletas ou mereciam maior destaque. A rede está repleta de sites e blogs, sejam grupos sociais ou páginas pessoais, com conteúdos desse tipo. Nele, mundos já encerrados ganham novo início, coadjuvantes obscurecidos angariam destaque, e tramas já estabelecidas adquirem uma nova perspectiva.

Talvez a história que mais tenha gerado fan fics no Brasil, sem que nenhuma delas tenha sido chamada por este nome, foi “Dom Casmurro”, de Machado de Assis. Um único tema – a traição de Capitu – foi capaz de gerar tal polêmica dentre os leitores da obra que várias outras histórias foram publicadas, dando novos olhares à trama machadiana. Nele, uma personagem relegada ao silêncio recebe voz e um simples olhar produz energia para que sejam criados discursos originais, com novos autores ansiosos por também poderem falar.

As fan fics, mais do que meras brincadeiras, são na verdade uma manifestação de nossos desejos, presentes em todo e qualquer leitor: o de poder, ele também, interferir na história. No processo de leitura, estamos tão envolvidos com o enredo, tão conectados aos personagens e seus dilemas que tendemos a querer agir dentro da história. E por mais que sejamos ativos no processo de leitura, pois cada leitor é capaz de interpretar um mesmo acontecimento sob diversos ângulos, ainda assim a sensação de controle que às vezes queríamos ter não nos é satisfeita. Quantos de nós já não terminamos um livro desejando imensamente que algumas coisas tivessem seguido outro rumo na trama. Isso aconteceu inúmeras vezes comigo, mesmo naqueles livros que muito me agradaram ou deixaram satisfeito. Tem sempre aquela pontada de arrogância, que nos diz que a história poderia até ficar melhor se tivesse acontecido desta e não daquela maneira.

E neste sentido, as fan fics nos servem como forma de extrapolar esses desejos, de transformarmos vilões em heróis, de desestabilizar a história de um autor que admiramos, não porque nos achamos melhores que eles, mas porque o admiramos de tal forma que queremos declarar ao mundo nosso contentamento, mostrando que não somos capazes de sobreviver completamente sem seus trabalhos, e já que eles deram por encerrado seus livros, temos então nós mesmos que dar continuidade a obra, impedindo-a assim de morrer.

As fan fics, nesse sentido, não são plágios, mas sim esforços de manter uma memória viva, mesmo que esta memória seja apenas ficção. Uma forma de exercer nosso direito de sermos também criadores. Escrever este gênero é sem dúvidas um exercício importante e satisfatório. Já fiz muitas, embora jamais tenha as escrito em folha, mas sim as mantendo no enredo oral, através das aventuras de RPG. E nestes momentos, fui capaz de treinar minha imaginação. Apoiando-me no mundo de outros mestres, era capaz de criar esboços dos meus próprios universos. Até já ser maduro o suficiente para caminhar sobre minhas próprias pernas.

Enfim, acho incrível o potencial que este gênero possui, e fico igualmente surpreso com seu pouco reconhecimento nos meios acadêmicos, acredito que o processo de readaptação da obra de autores conhecidos por desconhecidos, através das fanfics, renderia ótimos trabalhos de graduação e pós-graduação nas áreas de Letras, Ciências Sociais e, por que não, História. Ou talvez, ao fim e ao cabo, seja realmente melhor assim. pois este ofício, sendo mantido assim, no meio popular, livre nas mãos dos fãs das mais diversas idades, níveis de escolaridade e classes sociais, preserve essa energia criadora que faz com que todo o dia centenas de histórias sejam escritas e dezenas de autores sejam revelados, mesmo que sem os louros da carreira literária.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Quando uma história se escreve sozinha.


Uma das coisas que sempre escutei, mas que sinceramente nunca entendi até me lançar no mundo da escrita, foi a célebre frase que se coloca ao título deste ensaio. Sempre a considerei uma figura de linguagem, ou apenas floreio retórico, daqueles que usamos para tornar mais nobre uma atividade ou um processo qualquer. Contudo, tenho que dizer que por mais estranho, ou simplesmente exagerado que possa parecer, isto de fato acontece, quase literalmente falando. Aconteceu a primeira vez quando escrevi “O Véu”. Foi realmente mágico, quase inexplicável.

Depois de preparar meu roteiro e já ter ao horizonte quase todo o enredo em que minha série se embrenharia, comecei a escrever. Primeiro, iniciou-se com pequenos desvios, uma frase que não imaginei antes, um contexto que não havia pensado e até mesmo personagens que não estavam previstos. Cada um deles, em princípio, me deixava nervoso, pois parecia que a qualquer momento todo o meu plano ruiria e eu acabaria me encontrando em um beco sem saída cuja a única solução seria começar novamente.

Mas por sorte não foi isso o que aconteceu. E neste momento entendia que, apesar de perder em precisão e controle, meu romance ganhava muito mais em termos de vivacidade. As palavras estavam praticamente se escrevendo sozinhas, como se fossem psicografadas, para usar um termo mediúnico. E neste processo, início, meio e fim se entrelaçavam em uma dança impulsiva, quase cósmica. Em determinados momentos, uma ação passada sem a menor importância me chamava à atenção, relendo-a, imaginava um novo contexto, uma nova possibilidade e de um trecho que estava ali para “encher linguiça”, uma nova trama se abria.

Lembro que já tive essa experiência quando narrava as aventuras de RPG para meus amigos. Logicamente que neste caso esse processo é encarado de forma natural, visto que eu, como narrador, não tenho o real controle sobre os personagens – cada um manipulado por um jogador – como teria com os de meu livro. Mas ainda assim, tal constatação não tornava o processo menos mágico. Ainda me lembro como se fosse hoje. Eu perdia horas do meu dia preparando uma trama, criando desafios e condições que se abririam para meus amigos, tentando lapidar a história para que os jogadores trilhassem, sem perceber, pelo caminho que eu havia traçado.

E ao fim, o que acontecia? Eles simplesmente estragavam tudo (risos). Por mais que eu tentasse empurrá-los para uma direção, sempre tinha um que procurava outro caminho. Não importava o quão óbvio eu tentasse deixar uma conclusão, eles sempre pensavam numa nova possibilidade. E o pior: algumas vezes essas invenções acabavam se revelando melhores do que aquela que eu havia primeiramente formulado. E nesses momentos, com um pouco de decepção e inveja, eu, com minha tremenda cara de pau, simplesmente reconfigurava a minha história, fazendo parecer que a ideia brilhante que o jogador havia tido no meio da aventura fosse, na verdade, minha, e que sempre esteve ali, mas só ele havia tido a perspicácia para desvendar.

E nestes momentos, a história de escrevia sozinha, através da relação entre narrador e jogadores, e seus embates. E não importava meu roteiro, meu preparo ou meu desejo de manter a história linear, eu sempre tinha, em algum momento, que lhe configurar novamente. Seja para corrigir uma burrada, seja para plagiar as ideias de outro.  Como disse, nada mais natural, já que temos neste tipo de história a múltipla autoria. Todavia, isto não desmerece o valor da experiência. Isso porque, na escrita, tal fenômeno também ocorre.

Nenhum autor é uma ilha, isso já deve ser óbvio para todos. Todo o grande escritor já foi um grande leitor, um espectador que em determinado momento resolve subir ao palco e ter o controle das ações daquele personagem que até então só pôde contemplar. Nesse sentido, o autor é alguém que está em eterno diálogo com o mundo, seja com seus pares e com aqueles que o antecederam, seja com a sociedade em geral, pelas experiências diretas ou indiretas. E no processo de escrita, o que fatalmente ocorre são novas ideias surgirem no meio do caminho. Às vezes porque lemos alguma coisa, ouvimos algo, ou simplesmente por conta de uma ideia que demorou a pipocar em nossas mentes.

E neste momento, quando uma ideia nova surge em meio a uma história em andamento, passamos a olhar nosso próprio trabalho como incompleto. E frustrados ficaríamos, se a imaginação não desse conta de se reinventar. Se não fosse a mirabolante engenhoca que é a capacidade de fantasiar, nenhum trabalho ficaria concluído. Pois por mais que nos preparemos, por mais rigoroso que seja o nosso método, não conseguimos – e sequer devemos – nos livrar desses momentos de profunda perdição, em que, sem saber ou entender, estamos dialogando com nosso projeto, com o mundo e com a energia criativa que pulsa em nossas mentes.

Talvez os gregos estivessem certos ao fim, e no céu existam musas que inspirem aqueles que se aventuram pelas artes. É uma ideia fantástica, mas, sem dúvida alguma, verdadeira. Se você já criou algo antes deve saber o que estou dizendo.  Naqueles momentos em que seu planejamento não da conta, em que você começa a abrir tantas arestas que não consegue imaginar como tudo ficará no final, ou simplesmente quando chega a um ponto em que parece que a coisa não andará mais. E depois, tudo se resolve, como mágica. É, sem dúvidas uma experiência única e maravilhosa.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Resenha: As memórias do livro, de Geraldine Brooks


Geraldine Brooks consegue mesclar diversos estilos neste trabalho, tornando “As memórias do livro” um romance que dificilmente desagradará completamente um leitor. A estrutura do livro se divide basicamente em duas partes, que se intercalam ao longo da narrativa. A primeira, volta-se para conservadora Hanna, convocada pela ONU para ir a Sarajevo em 1996, a fim de restaurar e escrever um ensaio acerca de um antigo Hagadá encontrado na região, ela passa por novas descobertas que vão além daquelas que são encontradas no manuscrito judaico: um amor, um poderoso segredo de família e as marcas da guerra. Estes elementos básicos tornam a leitura agradável para aquelas pessoas à procura de um romance leve. Todavia, Brooks não para por aí.
Cada capítulo de Hanna, onde esta encontra no manuscrito marcas que servem de vestígios das andanças do Hagadá ao longo do tempo, é seguido por um que conta a história do próprio documento. Cada sinal torna-se assim um rastro, que diz respeito a um momento da “vida” do manuscrito e das pessoas que por ele passaram. Uma asa de inseto, um pelo branco, marcas de vinho e sangue, cada um destes conta uma história, dá pistas sobre sua trajetória, serve de monumento para aqueles que o tocaram. Como historiador, confesso que fiquei fascinado com estes momentos, onde o diálogo presente e passado se estabelece de forma tão suave. Hanna, no presente, tenta buscar explicações para estas marcas deixadas no livro que as vezes remete, as vezes não, a realidade pela qual ele passou. Este é sem dúvidas um trabalho de história.
Para fins de conclusão, o romance de Brooks tem uma temática chave que perpassa todos os momentos das estórias: a questão do antissemitismo e da intolerância étnico/religiosa. Seja falando da inquisição, ou narrando experiências das personagens dentro do holocausto nazista, as memórias do livro nos apresentam um mundo onde a vontade de sobreviver na vida e na memória contra os desejos de obliteração travam batalhas colossais. O Hagadá, neste sentido, mais do que um objeto com a função de transmitir um tipo de conhecimento religioso, é o arauto da memória, aquele responsável por contar uma parte das histórias de pessoas cuja a voz não se houve mais, um vestígio de tempos e de homens que passaram pela Terra e deixaram sua marca, seja na escrita, no desenho, ou simplesmente por suas ações mais cotidianas. 



Resenha: Cinco minutos, de José de Alencar


Ser um clássico da literatura brasileira e ainda um grande representante de um movimento literário forte no Brasil como o romantismo, traz dois problemas para qualquer análise crítica de José de Alencar: o primeiro perigo é colocá-lo em um pedestal inalcançável, tornando seus trabalhos impossíveis de criticar seja pelo fato deste ser um clássico ou por estarmos tão longe dele no tempo que alguns aleguem que não seríamos capazes de entendê-lo por completo, mesmo que tentássemos. O segundo problema é, por este pertencer a um movimento literário que nos é ensinado como coeso e homogêneo ao longo de nossa vida escolar, subestimar a qualidade individual do autor e enquadrá-lo em enredos próprios de trabalhos deste estilo, ignorando assim as características próprias de cada livro.
Nesse sentido, vamos por partes. Cinco minutos é uma novela curta, como o próprio nome já sugere e como alega o próprio autor, que o considera um bom livro para ser lido em um momento onde o tempo anda cada vez mais curto para cada indivíduo. Ele narra a história de nosso narrador que em uma simples viagem de bonde conhece uma jovem, e nos cinco minutos que se passam de trânsito, consegue se apaixonar completamente por ela. Depois deste rápido e intenso encontro, enamorado pela jovem que conheceu tão brevemente, mas de forma tão terna, nosso herói se coloca em uma busca para conhecer mais dela e conseguir enfim declarar seu amor. Com base nesta breve introdução, muitos leitores já devem prever elementos que constituem o enredo. Temos um amor idealizado, uma mulher pura, uma série de barreiras para a realização deste amor e um fim trágico.
Para não estragar a surpresa de um futuro leitor, permitirei apenas dizer que alguns desses elementos surgem, outros não. Faço isso pois nesta resenha me proponho a realizar um duplo esforço: o primeiro, elementar, de fazer uma avaliação crítica do trabalho; e o segundo, mais específico, é auxiliar na desconstrução simplista que possuímos do passado literário. Pois nós costumamos entender o nosso tempo como algo complexo, multifacetado, heterogêneo, e temos a tendência a atribuir ao passado o lugar do óbvio, do previsível, do homogêneo. Como se só e somente nós fôssemos capazes de sermos plurais e aqueles que nos antecederam fossem todos iguais.
Enfim, encerrando com o muro das lamentações, justifico a escolha deste trabalho. Dos livros de Alencar que já li, este foi sem dúvidas o que mais gostei. O achei de bom tom, agradável, meloso em algumas partes, mas bonito na sua maioria. Partes surpreendentes aguardam aqueles que por ele se aventurarem, e uma leitura rápida e prazerosa também. E para não dizermos que estou dizendo isso apenas por ser José de Alencar, deixo a pequena alfinetada: odeio Iracema e Guarani. Mas enfim, isto já nos é uma outra história...

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Opiniões de quem já leu O Véu - Volume 1


Saudações colegas. 
Estando "O Véu" em processo de publicação, decidi postar aqui as opiniões, críticas e comentários daqueles que já me honraram com sua paciência e dedicação ao se debruçarem sobre meu trabalho.
Gostaria imensamente de agradecer a todos esses que me ajudaram lendo, comentando e divulgando este livro que me deu muito prazer em escrever. E espero ter proporcionado e ainda proporcionar a mesma alegria nos seus leitores.
E, logicamente, mais um agradecimento especial à Editora Subtítulo, que realizou este sonho.

Seguem os sites parceiros:

  




 





 E mais o site de relacionamentos SKOOB


Muito obrigado a todos


Willian Nascimento




 P.S. Aqueles que tenham resenhas e outras publicações referentes ao livro, podem me enviar que com muito prazer publicarei aqui no blog



terça-feira, 3 de julho de 2012

Resenha: O morro dos ventos uivantes, de Emily Bronte


Ainda não tive a oportunidade de testemunhar alguém que pudesse contar uma história capaz de mesclar amor e ódio de forma tão bela quanto Emily Bronte. “O morro dos ventos uivantes” é sem dúvidas um trabalho genial, com personagens dos mais diversos tons, capazes de nos comover tanto pelas suas virtudes quanto por seus vícios. As histórias de amor, apesar de agressivas, conturbadas, mechem com o leitor e eu fiquei completamente perdido sem saber para quem torcer e como deveria ser o final apropriado para a obra.
O livro se empenha em contar a desgraça da família Earnshaw, que após adotar um jovem filho de ciganos tem suas vidas gradativamente modificadas. A história nos é em grande parte narrada através da governanta da família, a senhora Ellen Dean, que recebe um viajante em uma das casas da família de Heathcliff (o garoto cigano que consegue tomar para si todas as posses da família que o adotou) e resolve lhes contar a saga de Catherine e seu patrão. Seus encontros e desencontros, tensões e afetos.
Heathcliff é sem dúvidas um personagem rico do ponto de vista literário, capaz de despertar no leitor amores e ódios tão intensos que o livro sangra de tanta paixão. Ele não é herói, também não é vilão, não é vitima, mas também não é simplesmente algoz. Heathcliff transita entre os dois polos de forma magistral, carregando a amargura e a dor de sua história de formas tão intrínsecas em seu ser que o leitor, por mais que apresentado a suas maldades, não consegue desprezá-lo por completo.
A narrativa do livro é densa. O primeiro capítulo é uma verdadeira prova de fogo, que exige do apreciador paciência para se acostumar com a forma de enredo de Bronte. Todavia, passando assim as primeiras páginas, o aventureiro poderá ir se adaptando a dureza do trabalho e com certeza apreciará o resultado. Recomendo fortemente este livro, um clássico que durante um tempo ficou esquecido, mas que renasceu ao grande público graças aos romances de Meyer. Quem diria que “Crepúsculo” nos traria algo de tão importante?

Resenha: Rato, Luís Capucho.


Apresentando-nos uma realidade bem próxima daquela própria do naturalismo brasileiro, o “Rato” de Luís Capucho pode vir a ser indigesto para estômagos fracos. Com um ambiente degenerado, sujo, personagens sem grades valores morais, o projeto do livro procura colocar-nos diante de nossa própria animalidade, do lado mais visceral do ser humano.
Confesso que não sou muito fã deste tipo de perspectiva, que considera o homem fruto do meio e não leva em conta valores individuais. Todavia, devo dizer que a proposta foi bem atendida. A personagem principal é um carioca, morador do Centro do Rio de Janeiro, habitando um cortiço que divide com sua mãe e muitos homens, que pagam o aluguel. Nosso protagonista, com uma sexualidade enrustida, percorre os ambientes mais vazios, obscuros e abandonados para poder dar vazão aos impulsos do seu corpo. Sem se importar com o parceiro ou as condições higiênicas do local, ele se entrega ao prazer carnal com homens dos mais diversos tipos. Sempre casual, até a chegada de Plínio, um novo morador da cabeça de porco.
A relação que se desenvolve entre os dois não pode ser chamada de um romance, não ao menos se tomarmos como padrão os que já estamos acostumados. É uma relação terna, sem pieguices, sem grandes momentos de clímax, mas estável e fiel. Nesse momento o autor nos convida a pensar, mesmo que de forma indireta, na própria natureza dos relacionamentos. Alguns, sem grandes perspectivas, sem momentos de romantismo, mas sem dúvidas sinceros a sua maneira.
Outra temática que se desenvolve no texto de Capucho é a sexual. Nela, o autor explora parte dos desejos humanos, suas taras mais inconfessáveis, ocultas, enrustidas e a capacidade de nos metermos nos ambientes mais insalubres para saciarmo-nos, quando as condições tidas naturais não nos são apresentadas para por em prática nossos desejos. Foi uma boa tentativa a de por para pensar acerca desse ponto do desejo sexual, mas admito que achei que ele poderia trabalhar melhor este momento.
Não gosto de fazer comparação entre livros quando resenho, mas não pude deixar de aproximá-lo da “Casa dos Budas Ditosos”, de João Ubaldo Ribeiro. Pois os dois tocam neste mundo instável, que pode repelir as mentes mais conservadoras. T|odos tentam andar por esse terreno acidentado que diz respeito a todos, mesmo que de forma inconfessável. Entretanto, acredito que Capucho não foi tão bem sucedido nesta tarefa. Pois se nossa incursão pelo mundo dos “Budas Ditosos”, apesar de chocar, ainda nos permite momentos de prazer intelectual dignos de nota, “Rato” não nos oferece o mesmo.
Pois nosso protagonista, apesar de entrar menos de cabeça no mundo da sua sexualidade que nossa promiscua Valentina, ainda assim a forma como suas aventuras nos é narrada não nos permite desfrutar de maneira plena de sua experiência. Fica mais difícil não julgar o rato, não achá-lo de certa forma desprezível, sujo. E os momentos em que ele tenta justificar seus impulsos ainda não são tão bem elaborados quanto os de Valentina. Deixando ao leitor pouca margem para se envolver com o personagem, reconhecendo-o como um indivíduo válido e aceitável.
Enfim, digo que saí da leitura de rato reconhecendo o valor de sua proposta, mas ainda assim desgostoso quanto a maneira como ela é aplicada. Provavelmente o autor pouco vai se importar com isto, pois acredito que este foi seu real objetivo: deixar aquele nó no estômago quando chega-se as páginas finais. Porém, ainda sim tenho que mostrar meu descontentamento quanto ao método empregado.