Sigam-me os Bons

domingo, 31 de outubro de 2010

A Construção do Gênio


Existem idéias que acabam sendo naturalizadas no imaginário coletivo. Termos, conceitos e entendimentos, que acabam ganhando caráter tão essencialista, que muitas vezes pensamos que eles sempre existiram desde que o mundo é mundo, e esquecemos que eles são, na verdade, produtos de uma construção histórica, filhos de um tempo e de um espaço específicos. Com base nessa introdução e à luz das considerações retiradas do ensaio anterior - A formação de um clássico e a qualidade da literatura - proponho a idéia central deste segundo ensaio, que ajuda a compor as reflexões anteriores sobre clássicos.

Hoje, é muito comum que chamemos grandes personalidades de gênio. Tony ramos é um Gênio, pois consegue passar a emoção de seus personagens como ninguém. Einstein foi um Gênio, pois conseguiu pensar além de sua época e quebrar paradigmas de Newton e outros cientistas modernos. J. K. Rowling é um gênio, pois foi capaz de criar a maior febre da literatura contemporânea.

Gênio é uma noção que, podemos dizer, é absolutamente moderna. Própria do século XIX, o gênio significa aquele ser dotado de habilidades especiais, que consegue a custa de seu alto grau, sobressair em meio às pessoas comuns. Tal concepção é muito própria do movimento Romântico, que dentre suas características, buscava a elevação do individual frente ao coletivo.  Nesse sentido, o que quero chamar a atenção é para o fato que essa construção – que pode ser certa ou errada, não quero entrar em juízo de valores – ainda é muito presente no nosso imaginário, e até hoje, mesmo depois das teorias sociológicas de Marx, Weber e Durkhein, ainda vemos o individuo como um ser autônomo, indiferente ao seu meio e que possui características próprias e inalienáveis.

Quando falamos então da construção de um clássico – tema anterior e que retorna nesta segunda parte – a noção de gênio vem com toda a força, e tendemos a pensar na permanência de uma obra até os dias de hoje como tributária unicamente desse elemento. Como já dei alguns exemplos na postagem anterior, não vou perder linhas aqui explicando que outras coisas estão por trás da transformação de um livro comum em um clássico, mas sim gostaria de retomar uma discussão ainda mais antiga, lançada em um ensaio aqui do blog, Homem e Sociedade: o autor no tempo e no espaço

O que proponho ao trazer essa discussão é justamente a de lembrar que, sem nenhum tipo de determinismo geográfico, todos nós, seres humanos, somos fruto de uma sociedade. Logicamente que a individualidade existe, mas ela está no centro de um meio social que a todo o momento dialoga e interage com ela. Nesse sentido, mesmo um gênio, com todo seu potencial único, não é capaz de florescer se não houver em seu redor o mínimo de condições que o torne produtivo. Um gênio só é gênio se ele for reconhecido como tal, seja em que tempo for.
Retomo a questão levantada no artigo sobre clássicos: “por que a grande maioria dos gênios só é reconhecida depois de sua morte?” Muitos com certeza responderão: “Pois eles eram indivíduos a frente de seu tempo, e que só puderam ser reconhecidos anos depois”. Eu proponho uma resposta mais ampla.
Só foram reconhecidos depois de seu tempo, pois as condições que possibilitaram suas idéias só existiram tempos depois. Elas só foram úteis anos depois. Muitos gênios não são reconhecidos em seu momento, assim como nenhuma obra é um clássico enquanto seu autor ainda está vivo. Somos nós, homens de presente, que atribuímos graus de genialidade aos artistas do passado. E damos essas atribuições, através de perspectivas que temos hoje. Perspectivas essas que só puderam ser vistas, quando tomamos um distanciamento temporal, que não é possível ser tomada quando a obra está em voga, está em discussões, está sendo lida ou ignorada pelo público.
Logo, se hoje não temos clássicos contemporâneos, não é porque nossos autores sejam inferiores, mas por que um clássico precisa de tempo para se firmar, e por isso, não seremos nós quem diremos se os livros produzidos hoje serão ou não clássicos, mas aqueles que ainda estão por vim, que vão ou não, se mostrarem interessados nas produções de ontem.

sábado, 23 de outubro de 2010

A formação de um clássico e a qualidade da literatura.


O que é um clássico? Como ele se forma? Quais são os atributos necessários para uma obra poder ser chamada assim? Essas são algumas das perguntas que servirão de guia para este ensaio.
Um clássico é, acima de tudo, um trabalho que consegue atravessar gerações. Ele tem a capacidade de transpor o seu tempo e servir de referência para autores e leitores anos, décadas, séculos, ou milênios depois. Entretanto, o que caracterizaria essa permanência?
Meu pensamento neste presente artigo pode parecer herege para muitos no começo, mas peço que vocês, antes de tomarem qualquer juízo, leiam-no todo para poderem entender aonde eu quero chegar.
Basicamente, duas idéias parecem naturalmente vinculadas quando falamos de um clássico: a idéia de qualidade, e a idéia de gênio. E são essas idéias que eu gostaria de problematizar. Seria realmente a qualidade, o único motor gerador de um clássico? Seria sua formação tributária apenas do gênio do autor?
Por que toco nesse assunto? Pois sinceramente me sinto um pouco incomodado com essa idéia. Não porque ache os clássicos ruins, mas porque ela geralmente delega à literatura contemporânea um patamar eternamente inferior. Então, por isso trago o problema da formação de um clássico para a questão e pretendo, nessas poucas palavras, apresentar outros elementos necessários para a formação de um clássico.
Muitos trabalhos foram produzidos ao longo da existência humana, muitos chegaram até nós, outros não. Alguns foram imortalizados, outros, foram relegados ao esquecimento. Mas a que interesses esses livros atendiam para serem imortalizados? Pensemos, por exemplo, na “Divina Comédia de Dante”, em “Os Lusíadas” de Camões, e em “Dom Quixote” de Cervantes. Esses foram, sem dúvidas, livros fundamentais para países específicos. Não só por sua qualidade, mas porque eles foram os trabalhos que conseguiram, pela primeira vez, sistematizar toda uma língua na forma de escrita. Podemos dizer sim que “Os Lusíadas” foi a obra que consolidou a língua portuguesa, trabalho esse que “A Divina Comédia” fez pelo idioma italiano e “Dom Quixote” pelo castelhano. Muito além de boas obras literárias, esses trabalhos tiveram como função sistematizar uma língua regional que até então só existia na fala, e transformaram-na em códigos escritos.
Outro exemplo, agora de natureza diferente. Pensemos nos clássicos gregos e romanos. Nos tratados filosóficos de Platão, Cícero e Aristóteles; nas dramaturgias de Eurípides, Ésquilo e Sófocles; nos escritos históricos de Políbio e Tucídides. O que os transformou em clássicos? Seria apenas a sua qualidade? Mais uma vez repito, não estou dizendo que esses trabalhos não tenham a sua qualidade, mas convido a você, leitor, a tentar olhar para eles através de um escopo mais amplo, podendo ver o que de além existe em sua constituição. O que quero chamar a atenção é para o fato de que esses livros, além de trazerem idéias, relatos ou representações de grande qualidade, também são parte dos poucos resquícios que a antiguidade nos deixou. São os poucos traços que ainda tempos daquele período e que nos permitem olhar para trás e reconhecer alguma coisa. Logo, muito mais do que uma função estético-artística, esses trabalhos nos servem como fontes de memória e de história.
Eu poderia aqui expor vários outros exemplos, mas para não desgastá-los demais com isso, proponho chegar logo à minha idéia principal. O que quero dizer com essas palavras não é que os clássicos sejam livros de baixa qualidade, ou que a imagem que se tenha criado em cima deles seja falsa. Não é isso, mas que temos sim que desnaturalizar a idéia do “gênio” presente neles e que guia a nossa forma de pensar, relacionando unicamente a formação de um clássico a um mérito qualitativo. Um clássico é um livro que, muito além de atender a necessidades estéticas, consegue trazer méritos além do artístico. E é por conta disso que sobrevivem, e por isso que são preservados.
Um clássico nunca é clássico no tempo em que foi construído. Sófocles, Goethe, Machado, Alencar, Flaubert, nenhum desses homens nasceram clássicos. Isso porque um clássico só pode ser construído depois de sua existência. Logo, o fato de nossa jovem literatura não ter nenhum clássico, não se deve ao fato dos escritores de hoje serem inferiores, ou comerciais, ou que adjetivo se queira usar. Mas porque ainda não se deu o tempo de eles se imortalizarem. Não se deu o tempo para que eles se tornassem gênios. Por melhores que sejam, ainda é preciso que eles desapareçam da vida para poderem entrar para a história.
A idéia de um gênio, como um homem, ou mulher, à frente do seu tempo, dotado de características especiais e que consegue se elevar diante de seus semelhantes não cabe aqui. Pois por mais talentoso que um indivíduo seja, ele só será de fato considerado um gênio se alguém reconhecer isso nele. Se alguém puder enxergar no seu trabalho algo de bom, algo de útil. E normalmente essa utilidade só é possível de se conseguir depois que ele se foi, pois enquanto vivo, um gênio ainda tem palavra, ainda pode se contrapuser a utilidade em que a ele é atribuída. Mas um morto, uma memória, não. Ela é utilizada, ela é construída sem o risco de que seu verdadeiro autor diga: “eu não tive a intenção disso”, ou, “eu não sou assim”. Posso estar acabando esse ensaio de maneira um tanto abrupta, mas faço disso um recurso para poder retomar esse assunto na próxima postagem.
Então, acho interessante tentar terminar esse artigo com uma pergunta que vise à reflexão prévia para meu próximo ensaio: “porque será que a maioria dos clássicos não é reconhecida em seu tempo?” 

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Ceticismo e Comédia.


Neste ensaio, resolvi falar da comédia. Um gênero específico que me chamou a atenção nos últimos meses por conta do problema referente à Lei 9.504/1997, que proibia o uso de charges, sátiras ou programas humorísticos que viessem a ridicularizar políticos durante as eleições. Por mais que a tensão desse debate já tenha se passado e a lei revogada, acho interessante abrir uma pequena discussão aqui sobre o tema. Pois, já que meu trabalho não tem nada de político, e sim teórico literário, meu interesse aqui não é levantar uma discussão de quão válida ou sensata é essa medida, e sim a de tentar discutir o estatuto. O que ela representa para uma sociedade. Tema esse que aos meus olhos pareceu se acentuar e que estava no cerne da questão debatida por essa polêmica.
Desde Platão, que a idéia da comédia como sendo algo doloso para uma sociedade já se mostrava. De acordo com o filósofo, a sátira tinha a capacidade de desvirtuar o bom cidadão e levá-lo à escarnecer de situações e problemas sérios. Nesse sentido, a comédia seria dolosa para um grupo humano por despertar nelas o desprezo pela vida pública e o desrespeito por questões graves. Essa temática parece ter sido trazida de volta com o problema da lei que proibia o humor na política, pois a idéia que levou à proibição dos programas humorísticos contra os políticos brasileiros, também, de acordo com o discurso dos legisladores e executores da lei, tinha como objetivo o de proteger a mentalidade pública dos perigos da gozação.
Nesse sentido, a comédia seria a causadora do ceticismo popular. Ela desvirtuaria o bom homem e o levaria a se desinteressar pela política, por exemplo. Porém, como eu sempre gosto de fazer, essa questão deve ser problematizada. Pois seria mesmo a comédia capaz de criar o ceticismo, ou o caminho mais seguro não seria o oposto?
Mais do que uma causa, a comédia é uma conseqüência, uma reação contra algo de que não está agradando. A comédia é um dos modelos de crítica mais populares da história, e desde os teatros gregos que elas vêm sendo utilizada como forma a pôr em debate popular as insatisfações contra um governo, ou contra outra questão de caráter público. Aristófanes é um bom exemplo disso, pois com suas comédias - “As Aves”, “As Vespas”, “A Assembléia das mulheres”, e outras – ele se apresenta como um crítico ferrenho do governo de seu tempo, como também de figuras ilustres à sua época, como o dramaturgo Eurípides e o filósofo Sócrates.
A comédia chega para ridicularizar aquilo de que ela é contra. Logo, ela só pode ser aceita em um ambiente aonde o objeto ridicularizado não seja bem visto aos olhos da platéia. Assim, um cristão fervoroso jamais virá a rir de uma piada sobre Jesus, assim como um petista ferrenho jamais achará graça de sátiras de Lula ou de Dilma. Da mesma forma que alguém pró FHC não irá rir de insinuações contra Serra. Nesse sentido, o ceticismo não é uma conseqüência da comédia, e sim é o ambiente necessário para que esta exista.
Não existe comédia em um lugar aonde reina a utopia. Isso porque não rimos daquilo que cremos, daquilo que realmente achamos possível. Não teria sentido uma piada zombando a lei da gravidade, porque para todos nós ela é um fato inquestionável. Mas quando a esperança em algo morre, então se é possível questionar, e, logo, se é possível zombar. Todos os grandes humoristas são céticos na sua realidade. E é justamente de sua descrença que vem a inspiração. Mas isso não quer dizer que eles sejam capazes de influenciar totalmente a descrença nos outros. Pois não podemos entender que o público seja uma simples tabula rasa que aceita de bom grado todas as idéias que a elas são transmitidas. Pelo, contrário, o público quem decide se algo é ou não engraçado. E ele só vai ser capaz de rir se em si já carregarem uma dosagem de descrença. Pois dessa forma eles se vêem representados na comédia.
E é nessa questão que a comédia toma seu aspecto mais sombrio. Aspecto esse que é representado muito bem pelo personagem Coringa, das histórias em quadrinhos de Bob Kane. Esse personagem ilustra muito bem o ponto máximo do comediante que divide a descrença da loucura. Pois de tão cético com relação ao mundo, o Coringa só é capaz de uma coisa: de rir dele. O riso, para ele é a única forma de dar graça a uma vida que não teria sentido algum. Dessa forma, a única alegria desse palhaço é literalmente a de ver o circo pegar fogo.
Para fins de conclusão, uma coisa que achei interessante destacar, e que esse debate político me proporcionou, foi o de entender melhor o próprio estatuto da comédia. Fazendo pensar em como ela está presente em nossas vidas. E não só: mas também como nos permitimos deixá-la fazer parte de nossas vidas.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Como registrar os direitos de seu livro?


Oi galera. Sei que essa postagem não segue a linha das anteriores nem a proposta oficial do blog – que é a de divulgar meu trabalho ou de discutir e refletir sobre temas da literatura -, porém, acho que esse assunto que irei expor agora é de vital importância para qualquer um que, como eu, deseja se tornar um escritor.
“Como registrar os direitos autorais do meu livro?” Essa foi uma pergunta que me fiz quando terminei “O Véu” e fiquei sinceramente surpreso com a certa dificuldade que encontrei ao tentar respondê-la. Numa pesquisa rápida, acabei encontrando referências muito vagas em um site amador, mas que só pude confirmar mesmo entrando em contato com a Biblioteca Nacional.
Nesse caso, acho interessante usar esse espaço para dar dicas para pessoas que tenham um trabalho pronto – seja um romance, um livro de poesias, uma ontologia de contos ou uma novela – para poder garantir os direitos autorais dele.
Pois bem, o órgão responsável pelo registro de novos exemplares é a Biblioteca Nacional. Fundada em inícios do séc. XIX, com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, a Biblioteca Nacional é hoje considerada pela UNESCO como uma das 10 maiores bibliotecas nacionais do mundo. Ela trata com os autores que desejam registrar seus livros através de postos estaduais, que estão espalhados pelo país.
Para saber onde fica o posto estadual fica mais próximo de sua casa, basta entrar no site da Biblioteca Nacional e seguir o seguinte percurso

Serviços a profissionais >> Escritório de Direitos Autorais >> Postos Estaduais

Ou, para facilitar o trabalho, vá direto para o endereço clicando AQUI.

Neste link você encontra, além dos endereços dos postos estaduais, o telefone e outras formas de contato, para ir tirando dúvidas antes de ir.
Pois bem, agora que sabe o local onde deve se dirigir, vem a próxima pergunta: “o que levar?”
Cada autor deve ir para o posto estadual levando consigo Identidade e Comprovante de residência (original e xérox); Vinte reais, que deve ser depositado na conta da Fundação Biblioteca Nacional (esse valor pode variar, dependendo do Estado. Esse custo é referente ao Rio de Janeiro); e uma cópia impressa de seu livro.
O Original impresso pode ser tanto manuscrito, xérox, impressão por computador, maquina de escrever ou outras formas em papel. Cada página de seu original deve vir numerada e com a rubrica do autor. Com exceção na primeira e da última página, onde deverão constar uma assinatura completa do autor.
Assim, você chega ao posto, munido de todas essas ferramentas, e lá pega um formulário que deverá ser preenchido e o número da conta onde deve depositar o dinheiro (recomenda-se que se deposite direto no caixa, pois assim o valor cai direto na conta e você não tem de esperar para continuar o processo).  Então, com o comprovante de pagamento e o formulário preenchido, você dá inicio ao processo, que é bem rápido.
O certificado oficial só chegará a sua casa dentro de dois ou três meses (esse tempo também pode variar, dependendo da localidade) e chegará por carta registrada. Ou seja, é necessário alguém para receber a assinar. Apesar dessa demora, a Biblioteca Nacional, no ato do registro, dá ao autor uma declaração, alegando que o livro já foi registrado. Dessa forma, apenas com isso você já poderá ir às editoras e mostrar seu original, pois elas aceitam essa declaração.

OBS: autores menores de idade devem levar consigo um responsável para assinar o formulário com ele. Esse responsável também deve levar identidade e Xerox.

Bem gente, é mais ou menos isso. Parece complicado, mas não é. Logo que você pega o jeito a coisa fica bem natural. (risos)
Espero que essa postagem venha a ajudar muitos e muitos autores a protegerem seus direitos.

Abraços galera

Willian Nascimento