Trabalhar com a família mais divertida da América já é um bom pretexto
para um livro ser um sucesso. Some isso a uma discussão que englobe religião e
costumes americanos e você tem grandes chances de conseguir um Best Seller. “O
evangelho segundo os Simpsons” é uma coleção de artigos de Mark I. Pinsky em
que o jornalista se propõe a observar como a temática religiosa aparece no
desenho animado.
Com um argumento forte, a de que as critica de “Os Simpsons” deve ser pensada
mais como uma crítica aos costumes religiosos norte americanos e não
propriamente a experiência religiosa em si, e também com uma boa percepção de
como “Os Simpsons”, apesar de seu perfil “imoral”, traz em si grande dose de
moralidade cristã em seus roteiros, o livro começa bem. Todavia, apresenta
certas falhas no modo em que estrutura seus argumentos.
Em primeiro lugar, a organização temática é um tanto quando falha. O
livro é dividido em grandes temas como “imagens divinas”, “a igreja e o
pregador”, “católicos”, “judeus”, “hindus” onde são discutidos todos os
aspectos dessas ideias que por si só já são imensas. E tal estratégia tende ao
caos, levando-se em consideração que Pinsky fala de cerca de quinze temporadas.
Outro problema, e este entrelaçado a questão de desorganização, é que o
autor não cita os episódios. Em vários momentos ele apenas reproduz a fala dos
personagens sem dizer qual episódio, qual temporada ou em que situação tal
personagem diz alguma coisa, nem mesmo em uma nota de rodapé. E mesmo eu, que
me considero um fanático no desenho, tive sérias dificuldades em identificar
alguns dos argumentos do autor. E essa falta de citação acaba por gerar dois
problemas.
O primeiro já foi dito, pois dificulta a leitura deste “evangelho”, na
medida em que o apreciador não consegue, muitas vezes, situar-se em meio aos
argumentos do autor. Outro é que acaba por esconder certas ações tendenciosas
do próprio Pinsky. Em alguns momentos fui capaz de perceber certas distorções
na retórica deste.
Algumas interpretações horas são forçadas, horas distorcidas. Tudo para
validar a tese principal do livro. Os personagens são vistos exageradamente
como coesos, ignorando assim as próprias transformações que Homer, Marge, Lisa
e Bart sofrem ao longo das temporadas. Modificações essas que são comuns ao
longo das temporadas, por se tratar de um desenho que também é comercial e onde
os personagens são produzidos para agradar ao público, e por isso vão se
adaptando a suas melhores características, ressaltando-as.
Outro problema, e deste eu retiro Pinsky, é com relação à tradução e
revisão. Muitas passagens foram traduzidas erroneamente, confundindo falas e
personagens, e a revisão deixou passar erros básicos que um segundo olhar de um
revisor poderia ter facilmente percebido. E algumas passagens parecem até que
foram jogadas no tradutor Google e inseridas ao livro desta mesma forma.
Enfim, apesar de não parecer, eu posso dizer que gostei da leitura.
Gostei porque me permitiu discutir temas de que gosto muito. Por ser um fã de “Os
Simpsons” e um estudioso de história das religiões, adorei a temática do livro.
E justamente por discordar imensamente de Pinksy em diversos momentos, “o
evangelho segundo os Simpsons” me permitiu momentos de puro exercício
intelectual. Contudo, temo que pessoas não muito inseridas nessas duas
temáticas possam, ou não se sentirem amplamente convidados a participar do
livro, ou então acabarem por comprar argumentos muito pouco sustentáveis.
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