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terça-feira, 12 de junho de 2012

Debaixo das sombras do passado.


Apesar de todo o presentismo de nossa atual sociedade, onde o que vale é o aqui e o agora, não podemos desprezar o peso que o passado ainda exerce sobre os nossos ombros. Além de sermos constantemente comparados com as gerações anteriores – principalmente pelos saudosistas que insistem em pregar aos quatro ventos como antigamente as coisas eram melhores – a todo o momento temos sob nossas cabeças os paradigmas estabelecidos pelos exemplos que vieram antes de nosso nascimento.

Na escrita, como em toda a área, temos os grandes gênios cuja mitologia construída em torno deles os tornam inalcançáveis. Apropriando-me de Nietzsche posso dizer que todo o escritor hoje já nasce castrado. Pois por melhores que sejamos, jamais seremos tão bons quanto Machado de Assis, ou José de Alencar. Nunca, por mais que queiramos e nos esforcemos, chegaremos perto de suas grandezas. E tal castração – muitas vezes autoimposta - nos é forçada pela nossa própria tradição, que galgou um lugar especial para os clássicos de tal forma que, monumentalizando-os, transformara-os em gigantes cuja sombra sob o presente nos impede de enxergar nossos próprios titãs.

E tal perspectiva não é de todo o estranha se compreendermos que o presente é realmente um ambiente bastante infértil para a percepção dos próprios potenciais, por ser tão instável e incerto. Artistas hoje vem e vão. Quais vingarão, não sabemos. Muitos são estrelas que podem permanecer por milhões de anos iluminando o cosmos, mas a maioria não passa de fogos de artifício, que somem após alguns instantes de brilho. E isso não é uma prerrogativa do presente. No passado também existiram escritores que não vingaram, que por não conseguirem marcar a história, desapareceram no tempo. Contudo muitas vezes esquecemos disso, pois tudo o que temos do passado é o que nos foi deixado de herança, o que sobreviveu.

Aristóteles, Agostinho, Kant, Lima Barreto e tantos outros que chegaram a nós nada mais são do que os sobreviventes de um verdadeiro genocídio literário, onde tantos outros autores pereceram. A única diferença entre os titãs de hoje e os de ontem é que estes já passaram por seu tempo e chegaram ao nosso, e sabemos disso. Já os nossos ainda estão em transição para o futuro e jamais saberemos se chegarão ou não, pois até lá iremos perecer. O passado, ao contrário do presente, já nos parece um terreno mais preciso, pois o caos já passou e por isso os homens de hoje são capazes de olhar para ele e ver os seus erros e acertos. Os clássicos já são clássicos, já chegaram a nós, já se firmaram, por isso são geniais.

Quantos autores hoje não se inferiorizam perante os grandes autores de outrora? Quantos não duvidam de sua própria capacidade? E quantos não se castram por conta disso? Mas será que somos só nós? Que os nosso gênios também não passaram por tais situações? Será que eles realmente, desde seus nascimentos, tinham certeza do lugar que ocupariam na história do mundo? Logicamente que não.

Eles também viveram incertezas, também foram inseguros, também tiveram seus próprios paradigmas, criados por outros gênios que os antecederam, que faziam sombra sobre eles. E foi nessa relação onde, seja tentando imitar a grandeza do seu ídolo, seja se contrapondo a ela, querendo se impor perante o passado, que conseguiram também firmar seus lugares em nosso panteão. E, infelizmente, a maioria deles não chegaram a saber nunca que se tornaram clássicos, pois este título só lhes foi ofertado após o fim de suas existências.

Desculpem o tom de autoajuda deste escrito, mas é sim importante salientar que por mais grandioso que o passado possa nos parecer, não podemos esquecer que o presente também guarda seus próprios gigantes, que estão escondidos sob as sombras, apenas esperando o momento certo de despontarem. E qualquer um de nós pode ser um desses pequenos gigantes que marcarão presença no futuro. Qualquer um.

E tal pensamento pode parecer otimista demais, pois realmente estamos inseguros com nossos futuros. Não sabemos para onde vamos, o que nos espera no fim, mas isso é normal. Basta cada um de nós parar para pensar em nossas vidas e ver quantas coisas hoje nos fazem sentido mas antes, enquanto elas de fato aconteciam, não eram verdadeiros terrores para nossas existências. E quanto a isso me refiro a tudo, desde os amigos que fizemos, as escolhas vocacionais que realizamos, os esforços que empregamos para conseguir vencer na vida. Todas essas coisas, no momento em que estão sendo realizadas são verdadeiras entropias. São como espadas de Dámocles, pendidas sob nossas cabeças por curtos fios que podem se romper a qualquer momento e nos decapitar em questão de segundos. Mas depois que passamos por elas e conseguimos olhar para trás, aí sim somos capazes de ver que tudo fez sentido, seja pelos nosso acertos que nos trouxeram até aqui, seja pelos nossos erros aos quais, apesar de ruins, sobrevivemos a eles.

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